
Há algo melhor do que o sorriso de uma criança?
Há. O sorriso de uma criança com poucos motivos para sorrir.
E há algo melhor do que o sorriso de uma criança com poucos motivos para sorrir?
Pode parecer egoísta, mas há.
Eu saber que sou eu a provocar esse sorriso.
E há algo melhor do que o sentimento de provocar o sorriso de uma criança com poucos motivos para sorrir?
Há.
Fazê-lo, quando faço aquilo de que mais gosto. Andar de moto.
Este fim de semana foi assim. Espectacular em todos os sentidos, diria até, perto da perfeição. Copos, motos, companhia excelente, duas acções altruístas que nos fazem sempre sentir muito bem no final do dia e com o sentimento de dever cumprido, a saber que servimos um propósito maior do que o nosso próprio umbigo.
Motoexpo na FIL com cerveja de borla, festa dos 20 anos do M.C. Lisboa na sexta feira.
Sábado, o evento quadrimestral da dádiva de sangue com o pessoal das motos na parte da manhã, almoço e depois uma daquelas viagens que eu adoro, de 7 horas para fazer 200kms, com curvas qb, paragens longas na amena cavaqueira, cerveja a rodos numa paragem de quase três horas no M.C. Marquês de Pombal, jantar às onze da noite num tasco onde gargalhadas não faltaram, um snookerzito e umas minis para terminar a noite.
Domingo, acordar cedo para me ajuntar a uma caravana de 47 motos, 90% ferros, num evento dos Star Riders, o Egg Run, uma espécie de Pais Natal motards, mas por alturas da Páscoa (e sem fatos de coelho, embora a algumas motards até provavelmente lhes ficaria muito bem), e seguir para o Centro de Juventude S. Francisco de Assis, onde algumas dezenas de crianças carenciadas, de afecto, de dinheiro, de praticamente tudo, nos aguardavam. A alegria delas ao nos verem a chegar com as motos foi qualquer coisa de indescritível. Assim como quando receberam todas as prendas que lhes levámos, e se deliciavam com as guloseimas que lhes demos.
Mas o melhor estava ainda por vir. Os putos maravilhados enquanto fazíamos de carrocel com eles, à pendura nas motos, rua acima, rua abaixo, volta e troca de puto, "agora sou eu, agora sou eu". Não há palavras.
Não há palavras que comecem sequer a descrever o sentimento que é dar esta alegria aos putos, que tiveram um dia que se hão-de lembrar para o resto das suas vidas.
Como não há palavras para descrever também o coração a partir-se quando os deixámos, em que nos perguntavam insistentemente se lá voltávamos depois do almoço... E que quando dizíamos que não, respondiam, "está bem, então até pró ano". Ou o Henrique, uma das crianças, a dizer para um dos que nos acompanhava, para que voltasse, mas não no Verão, porque ele nessa altura não estava lá, estava de férias.
Podia escrever muito mais, mas nada ia começar por descrever o que se sente.
Só lá estando.
E ainda bem que estive. E vou estar sempre que puder.
O feijão nem sabe a sorte que vai ter por poder ter as condições de vida que vai ter, como cada um de nós não imagina a sorte que temos. Ainda bem que assim é.
Mas que, de quando em vez, nos lembremos de todos quantos não têm a mesma sorte, e que devolvamos alguma da nossa.
Vale a pena. Por eles, e por nós.